Testículos e distúrbios testiculares – Elizabeth G Nabel
Última revisão: 12/07/2012
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Elizabeth G. Nabel, MD*
President, Brigham and Women's Hospital, Professor of Medicine, Harvard Medical School, Boston, MA
Artigo original: Nabel EG. Testes and testicular disorders. ACP Medicine. 2010;1-12.
[The
original English language work has been published by DECKER
INTELLECTUAL PROPERTIES INC. Hamilton, Ontario, Canada. Copyright © 2011
Decker Intellectual Properties Inc. All Rights Reserved.]
Agradecimentos:
o autor e os editores agradecem pelas contribuições do autor da edição
anterior, Peter J. Snyder, MD, ao desenvolvimento e redação do presente
capítulo.
Tradução: Soraya Imon de Oliveira
Revisão técnica: Dr. Euclides Furtado de Albuquerque Cavalcanti
Os
testículos começam a funcionar precocemente no útero e continuam
funcionais na senescência; porém, as consequências de seu funcionamento
variam ao longo da vida. As doenças que afetam a função testicular,
portanto, produzem consequências diferentes ao longo da vida. Doenças
testiculares, do hipotálamo e da hipófise podem afetar a sua função.
Esses distúrbios podem ser tanto congênitos como adquiridos [Tabelas 1 e
2].
Tabela 1. Causas de hipogonadismo primário
Congênito
|
Adquirido
|
Anormalidades cromossômicas
|
Orquite (p. ex., caxumba)
|
Síndrome de Klinefelter
|
Radiação ionizante
|
Homem 46 XX
|
Fármacos
|
Microdeleções do braço longo do cromossomo Y
|
Agentes alquilantes
|
Criptorquidismo
|
Cetoconazol
|
Distúrbios da biossíntese do androgênio
|
Álcool
|
Distrofia miotônica
|
Traumatismo
|
|
Torção testicular
|
|
Dano autoimune
|
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AIDS
|
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Orquiectomia bilateral para câncer testicular
|
Tabela 2. Causas de hipogonadismo secundário
Congênito
|
Adquirido
|
Deficiência isolada de gonadotrofina
|
Tumores e cistos benignos
|
Deficiência isolada de hormônio liberador de gonadotrofina (GnRH)
|
Adenomas hipofisários
|
- Com anosmia (síndrome de Kallmann)
|
Craniofaringiomas, disgerminomas, cistos da bolsa de Rathke
|
- Com outras anormalidades (síndromes de Prader-Willi e de Lawrence-Moon-Biedl)
|
Tumores malignos
|
- Sem outras anormalidades
|
Metástases oriundas de malignidades do pulmão e das mamas, entre outras
|
Mutações no gene codificador do receptor de GnRH ou nos genes LH-beta, FSH-beta ou DAX-1
|
Meningiomas, gliomas
|
Deficiências múltiplas de hormônios hipotalâmicos e hipofisários (mutações nos genes LHX3, LHX4, HSX1, PROP-1)
|
Linfomas
|
|
Doenças infiltrativas (p. ex., sarcoidose, histiocitose da célula de Langerhans, hemocromatose)
|
|
Doenças infecciosas (p. ex., tuberculose, histoplasmose)
|
|
Infarto hipofisário (p. ex., síndrome de Sheehan)
|
|
Hipofisite linfocítica
|
|
Traumatismo
|
|
Cirurgia
|
|
Radiação
|
|
Doença sistêmica (inanição, anorexia, doenças crônicas e agudas)
|
|
Medicações (glicocorticoides, acetato de megestrol, suramina)
|
|
Drogas de abuso (álcool, opioides)
|
|
Hiperprolactinemia
|
|
Deficiência de GnRH adquirida isolada
|
|
Puberdade retardada (fisiológica)
|
Função testicular normal
Os
testículos possuem duas funções: secretar testosterona e produzir
espermatozoides. O efeito cumulativo da testosterona consiste em
produzir e manter um indivíduo fenotipicamente masculino. A função
testicular é estimulada pelas gonadotrofinas, hormônio
folículo-estimulante (FSH) e hormônio luteinizante (LH). FSH e LH são
secretados pelos gonadotrofos hipofisários que, por sua vez, são
estimulados pelo hormônio liberador de gonadotrofina (GnRH) oriundo do
hipotálamo.
Síntese e secreção de gonadotrofinas
O
GnRH é um decapeptídeo clivado a partir de um peptídeo precursor maior
sintetizado no núcleo arqueado do hipotálamo. FSH e LH são sintetizados
nos gonadotrofos hipofisários. Cada um desses hormônios é um
glicopeptídeo heterodimérico, composto por uma subunidade?alfa comum e
uma subunidade beta exclusiva.
O
GnRH percorre a circulação portal hipotalâmica-hipofisária e segue para
a hipófise, onde se liga a receptores acoplados à proteína G
localizados na superfície dos gonadotrofos. Essa ligação desencadeia uma
cascata de vias de sinalização intracelulares, bem como estimula a
síntese e liberação de LH e FSH. Embora não seja possível medir
prontamente os níveis de GnRH na circulação portal ou periférica em
humanos, a secreção desse hormônio é considerada pulsátil, uma vez que a
secreção de LH e de GnRH são pulsáteis em modelos experimentais
animais. Adicionalmente, o tratamento à base de GnRH de homens com
deficiência desse hormônio eleva a secreção de LH aos níveis normais
somente quando o GnRH é administrado em pulsos.1
A
testosterona inibe a secreção de GnRH e, assim, diminui tanto a
secreção de LH como a de FSH. A secreção de FSH também é seletivamente
inibida pela inibina – um produto das células de Sertoli localizadas nos
túbulos seminíferos, que atua diretamente sobre o gonadotrofo.
Testosterona
Síntese e secreção
A
produção de testosterona ocorre nas células de Leydig. O LH estimula a
síntese de testosterona quando se liga ao receptor de superfície nas
células de Leydig e ativa o mecanismo mediado pelo monofosfato de
adenosina cíclica, que intensifica a clivagem da cadeia lateral do
colesterol e a conversão à pregnenolona e, eventualmente, à
testosterona. A testosterona é sintetizada a uma taxa de 5 a 7 mg/dia. A
secreção de testosterona é episódica, pois é estimulada pela secreção
igualmente episódica do LH, e segue um padrão diurno: em um homem jovem
normal, as concentrações desse hormônio atingem seu pico por volta das 8
horas da manhã. Os níveis de testosterona são mínimos em torno das 20
horas.2
Ligação plasmática
Proporcionalmente,
98 a 99% da testosterona circulante está ligada a proteínas
plasmáticas. Desse total, cerca de 40% está ligada com afinidade à
globulina ligadora de hormônio sexual (SHBG, sex hormone-binding
globulin), enquanto 60% está ligada com baixa afinidade à albumina. A
testosterona ligada à SHBG não é disponibilizada para os tecidos,
provavelmente ao contrário daquela ligada à albumina. A síntese de SHBG é
estimulada pelos estrogênios e tiroxina, sendo diminuída pelos
androgênios, insulina e hormônio do crescimento.
Ações
A
testosterona exerce vários efeitos diferentes sobre os tecidos. Tais
efeitos se devem, ao menos em parte, à atuação desse hormônio em nível
celular, sob a forma de três hormônios distintos: a própria testosterona
e mais dois metabólitos – di-hidrotestosterona (DHT) e estradiol. Tanto
a testosterona como a DHT atuam ligando-se ao receptor de androgênio,
que é codificado por um gene localizado no cromossomo X e pertence à
superfamília de receptores nucleares de hormônios.3 O
receptor de androgênio é constituído por 3 domínios: aminoterminal, de
ligação ao DNA e de ligação ao ligante. Embora exista só um receptor de
androgênio, a DHT se liga com maior afinidade e, dessa forma, exerce
efeitos que não são produzidos pela testosterona. A presença de
moléculas coativadoras ou correpressoras da transcrição em certos tipos
de células também poderia explicar a causa da variação dos efeitos da
testosterona nos diferentes tecidos.4 Adicionalmente, a
variabilidade observada na repetição CAG N-terminal, que está associada a
anormalidades da ação da testosterona em estados de doença, poderia
resultar em alterações dos efeitos normais desse hormônio.
O
efeito direto da testosterona sobre as células é mediado por sua
difusão passiva para dentro das células, ligação ao receptor de
androgênio, ligação do complexo testosterona-receptor de androgênio ao
DNA, e subsequente estimulação da síntese de RNA mensageiro (mRNA) e
proteínas. Esse mecanismo é responsável pela ação estimuladora da
testosterona na transformação dos ductos wolffianos em genitais internos
masculinos durante o desenvolvimento embrionário.5 O efeito
direto da testosterona provavelmente também é responsável pela
estimulação da eritropoiese, crescimento muscular, aumento do
crescimento ósseo linear, e, até certo ponto, aumento da densidade
mineral óssea.
Nos
tecidos que manifestam a enzima 5 alfa-redutase, a testosterona é
irreversivelmente convertida a DHT no citoplasma da célula-alvo. Foram
identificadas duas formas de 5?alfa-redutase: de tipo 1, encontrada de
forma predominante na pele não genital e no fígado; e de tipo 2,
encontrada sobretudo no tecido urogenital de homens e mulheres. A DHT
liga-se ao receptor de androgênio com maior afinidade e, assim, exerce
um efeito mais significativo do que o causado pela testosterona. Após a
ligação da DHT ao receptor de androgênio, o complexo DHT-receptor se
liga ao DNA, estimulando a síntese de mRNA e proteínas. Esse mecanismo
parece ser responsável pela diferenciação masculina dos genitais
externos in utero,5 aumento do tamanho dos genitais externos masculinos durante a puberdade e desenvolvimento de pelos púbicos.
Nos
tecidos que manifestam o complexo da enzima aromatase – especialmente
alguns núcleos hipotalâmicos, tecido adiposo, fígado e talvez ossos – a
testosterona é convertida a estradiol. Este, por sua vez, se liga aos
receptores de estrogênio. Esse mecanismo parece mediar vários efeitos da
testosterona e um destes é o efeito sobre os ossos. Em indivíduos do
sexo masculino que apresentam mutações nos genes codificadores do
receptor do estrogênio6 ou da enzima aromatase,7
as epífises não se fecham e os ossos são osteoporóticos. Outro efeito
atua na libido, conforme sugerido no relato de caso de um homem com
deficiência na produção de enzima aromatase e cuja libido era fraca, até
que ele foi tratado com estradiol.8 A aromatase parece
mediar parcialmente a inibição da secreção do LH pela testosterona e
integralmente a inibição da secreção de FSH também estimulada por esse
hormônio.9
Espermatogênese
A
espermatogênese ocorre nos túbulos seminíferos e é estimulada
principalmente pela testosterona. A concentração de testosterona nos
testículos é 100 vezes maior que na circulação periférica. Essa alta
concentração, essencial à espermatogênese, provavelmente resulta tanto
da produção de testosterona LH-estimulada nas células de Leydig
adjacentes como da ligação da testosterona à proteína ligadora de
androgênio sob estimulação do FSH. A proteína ligadora de androgênio é
produzida pelas células de Sertoli, nos túbulos seminíferos. O FSH
também estimula as células de Sertoli a secretarem activina que, por sua
vez, estimula a espermatogênese. Adicionalmente, as células de Sertoli
secretam inibina e esta inibe a secreção de FSH pela hipófise.
A
espermatogênese dura aproximadamente 3 meses. Uma espermatogônia demora
cerca de 75 dias para se transformar num espermatozoide maduro. A
passagem pelo epidídimo, onde a motilidade é adquirida, leva mais 14
dias.
A função testicular ao longo da vida
A
função testicular tem início in utero; aumenta brevemente durante os
primeiros meses da infância e declina gradualmente durante a idade
adulta.
In utero
A diferenciação sexual ocorre ao longo do primeiro trimestre do desenvolvimento in utero.10
Em presença do gene SRY, localizado na região determinadora do sexo no
cromossomo Y, as gônadas indiferenciadas se transformam em testículos.
As células de Sertoli testiculares secretam hormônio antimülleriano, que
suprime os ductos müllerianos e, assim, previne o desenvolvimento de
genitais internos femininos.11 A gonadotrofina coriônica
humana (hCG) oriunda da placenta estimula as células de Leydig dos
testículos a secretarem testosterona. A testosterona, por sua vez,
contribui para os ductos wolffianos adjacentes se transformarem nos
genitais internos masculinos (ductos deferentes e vesículas seminais).
Em consequência, a testosterona é convertida a DHT pelos primórdios dos
genitais externos. A DHT influencia essas primeiras formações a se
transformarem no pênis, escroto e próstata. Durante o terceiro
trimestre, o LH produzido pela hipófise fetal estimula os testículos do
feto a secretarem testosterona e disso resulta o desenvolvimento
peniano. Durante os primeiros meses do pós-parto observa-se um terceiro
aumento dos níveis de testosterona, bem como uma elevação dos níveis de
inibina B e hormônio antimülleriano, atingindo níveis próximos aos
observados no menino em fase puberal intermediária. As consequências
dessa elevação de níveis hormonais são desconhecidas. Subsequentemente, a
concentração sérica de testosterona diminui e se mantém relativamente
baixa até a puberdade.
Puberdade
Nos
meninos, a puberdade começa com o aumento da secreção de LH e FSH pela
hipófise, que provavelmente é estimulado por um aumento da secreção de
GnRH pelo hipotálamo. A média da idade em que isso ocorre é 11,4 ± 1,1
anos. A consequência inicial consiste no aumento do volume testicular,
que passa de 2 mL para 20 a 25 mL, atingindo a capacidade observada no
adulto. A elevação dos níveis circulantes de testosterona provoca
aumento do tamanho do pênis e promove o crescimento de pelos púbicos,
axilares e, eventualmente, corporais e faciais, juntamente com a
regressão dos pelos na região temporal do couro cabeludo, que prossegue
ao longo das décadas. A testosterona também causa intensificação do
crescimento dos ossos longos, aumento da altura corporal, espessamento
das cordas vocais e diminuição da voz, além de aumento da concentração
de hemoglobina. A maioria dessas alterações demora 4 a 5 anos para ser
finalizada, contudo o desenvolvimento completo dos pelos corporais e da
barba ainda leva vários anos para ser concluído.
Senescência
Conforme
o homem envelhece, sua concentração sérica total de testosterona
diminui de forma gradual e com magnitude relativamente pequena [Figura
1].12-14 Os níveis de SHBG, contudo, aumentam com o avanço da
idade, de modo que a concentração de testosterona livre sofre um
decréscimo mais significativo do que a concentração de testosterona
total. Estudos transversais revelam que em torno dos 80 anos de idade a
concentração de testosterona livre equivale a cerca da metade da
concentração observada aos 20 anos de idade.15 A queda dos
níveis de testosterona parece resultar tanto da secreção diminuída de LH
como da menor responsividade das células de Leydig, embora seja
provável que a primeira é mais importante, pois as concentrações de LH
são relativamente baixas para as concentrações séricas de testosterona.16
Os paralelos existentes entre a senescência masculina e o hipogonadismo
masculino – ambos marcados pela diminuição da libido, energia, massa e
força musculares, e densidade mineral óssea – sugerem que a deficiência
de testosterona poderia ser a causa das alterações observadas durante a
senescência masculina.16 Por outro lado, a concentração sérica de estradiol também diminui com o avanço da idade.17
Diversos estudos mostraram que existe uma melhor correlação entre
algumas consequências do envelhecimento (p. ex., diminuição da densidade
mineral óssea) e os níveis de estradiol, do que com os níveis de
testosterona. Mesmo assim, há evidências de que no homem idoso a
elevação da concentração sérica de testosterona aos níveis encontrados
em homens jovens resulta em aumento da densidade mineral óssea,18 da massa e força musculares,19 bem como diminuição da massa gorda,20 dando suporte à noção de que uma diminuição dos níveis de testosterona pode ter consequências indesejadas.
Figura
1. Concentração sérica de (a) testosterona e o (b) índice de
testosterona livre de 890 homens sadios que foram longitudinalmente
acompanhados.12
Hipogonadismo masculino
Etiologia
O
hipogonadismo masculino pode ser subsequente a uma doença testicular
(hipogonadismo primário) ou a uma doença hipofisária ou hipotalâmica
(hipogonadismo secundário). Certos sintomas sugestivos de hipogonadismo
são, todavia, usualmente inespecíficos, enquanto alguns sinais são mais
específicos. O diagnóstico deve ser confirmado por meio de testes
laboratoriais.
Diagnóstico
Achados clínicos
Os
achados clínicos de hipogonadismo podem ser o resultado de uma
espermatogênese diminuída ou da secreção reduzida de testosterona. Os
sinais causados pela espermatogênese diminuída são infertilidade e,
menos frequentemente, diminuição do tamanho dos testículos. Por outro
lado, a menor secreção de testosterona produz uma ampla variedade de
consequências clínicas, dependendo da fase da vida na qual ocorre.
Quando a deficiência de testosterona ocorre no primeiro trimestre do
desenvolvimento in utero, a diferenciação sexual masculina fica
incompleta. Uma deficiência total de testosterona durante esse período
resulta no desenvolvimento de genitais externos femininos (isto é,
clitóris e lábios), enquanto a deficiência incompleta acarreta
virilização parcial, que varia da fusão labial posterior (nos casos de
deficiência de testosterona severa) a hipospádia (em casos brandos de
deficiência). A deficiência que começa no terceiro trimestre da via
intrauterina resulta na diferenciação sexual masculina normal, porém com
microfalo ao nascimento; se acontece na infância, antes da puberdade, o
resultado é uma puberdade incompleta. Quando a deficiência se
desenvolve após a puberdade, há regressão de algumas alterações
puberais. Essas mudanças costumam ocorrer lentamente, enquanto os
efeitos associados podem surgir em velocidades distintas. Após a queda
dos níveis de testosterona, a energia e a libido diminuem em questão de
dias a semanas, sendo que a concentração de hemoglobina e o hematócrito
declinam em poucos meses. A diminuição dos pelos púbicos, da massa
muscular e da densidade mineral óssea usualmente não é detectada durante
vários anos.
Exame físico
O
exame físico enfoca primariamente a hipótese de o desenvolvimento
sexual ser consistente com a idade do paciente. Se o paciente for
adulto, deve apresentar pelos faciais, na região do tórax e por todo o
corpo; os pelos na região temporal do couro cabeludo devem estar
regredindo de maneira condizente com a idade e o padrão familiar do
paciente e os pelos púbicos devem ser densos e distribuídos em forma de
diamante. A voz deve apresentar um grau de profundidade adequado. A
musculatura deve ser normal para um homem. Deve haver menos gordura
subcutânea do que a quantidade encontrada em um menino ou mulher com
índice de massa corporal comparável. Os testículos devem medir 4 a 7 cm
de comprimento (volume de 20 a 25 mL). Se o paciente for adolescente, o
desenvolvimento deve estar de acordo com sua idade, se ainda criança, os
testículos devem ser descidos e não deve haver hipospádia.
O
exame físico também deve incluir uma avaliação para detecção de
possíveis proporções eunucoides e ginecomastia. Um indivíduo adulto do
sexo masculino normalmente apresenta o segmento corporal superior quase
igual ao inferior, e a medida dos braços abertos de ponta a ponta é
igual à altura. A ausência de testosterona e a presença contínua de
hormônio do crescimento durante a puberdade, como ocorre no
hipogonadismo primário e no hipogonadismo secundário isolado, provocam
retardo do fechamento epifisário e aumento do comprimento dos ossos
longos. Nesses pacientes, o segmento corporal inferior se torna mais
extenso que o segmento superior, e os braços se tornam mais longos do
que as pernas – uma relação conhecida como proporções eunucoides. Essa
relação ainda persiste após o tratamento à base de testosterona. Em
consequência, um homem de qualquer idade cuja distância do
calcanhar-ao-púbis seja mais do que 2 cm mais longa que a distância do
púbis-à-coroa e a distância entre os braços seja mais do que 2 cm maior
que a altura provavelmente desenvolveu hipogonadismo durante a
adolescência. A ginecomastia acompanha com frequência o hipogonadismo,
sendo especialmente comum em pacientes com hipogonadismo primário.
Achados laboratoriais
Havendo
suspeita de hipogonadismo baseada em sinais visíveis e sintomas, o
diagnóstico deve ser confirmado pela documentação da reduzida produção
de espermatozoides ou testosterona. Caso o hipogonadismo seja
confirmado, a próxima etapa consiste em medir os níveis de LH e FSH.
Concentrações séricas elevadas desses hormônios indicam hipogonadismo
primário, enquanto valores normais ou subnormais apontam hipogonadismo
secundário.
Espermatogênese.
A produção de espermatozoides pode ser mais prontamente avaliada pela
contagem de espermatozoides presentes em uma amostra de sêmen ejaculado.
Geralmente, os valores aceitos como normais para esse tipo de amostra
são uma densidade superior a 20 x 106 espermatozoides/mL ejaculado e uma contagem total superior a 40 x 106
espermatozoides/mL ejaculado. Mais de 60% dos espermatozoides devem ser
móveis, e mais de 30% devem apresentar cabeça com formato oval. Um
estudo sobre os padrões masculinos observados em 765 casais inférteis e
696 casais férteis revelou que a fertilidade estava associada a uma
densidade superior a 48 x 106 espermatozoides/mL, percentual de espermatozoides móveis acima de 63% e morfologia normal acima de 12%.21 A baixa fertilidade estava associada a uma densidade inferior a 13,5 x 106
espermatozoides/mL, percentual de espermatozoides móveis abaixo de 32% e
morfologia normal inferior a 9%. A fertilidade indeterminada foi
associada a valores intermediários. Uma contagem subnormal (p. ex., <
5 x 106 espermatozoides/amostra) pode resultar do
hipogonadismo primário ou do secundário. Uma contagem normal ou
discretamente subnormal (p. ex., 35 x 106
espermatozoides/amostra) associada a uma motilidade acentuadamente
anormal indica mais provavelmente uma anormalidade espermatogênica do
que um caso de hipogonadismo secundário.
A
biópsia testicular não costuma fornecer mais informações sobre
espermatogênese do que a análise de sêmen, porque a variedade das
respostas histológicas à lesão testicular é bastante limitada. É
provável que a biópsia seja útil apenas quando o sêmen ejaculado não
contém espermatozoides, mas os testículos apresentam tamanho normal e as
concentrações séricas de testosterona, LH e FSH são normais. Nesse
caso, o paciente pode apresentar obstrução do fluxo de saída
ejaculatório ou talvez tenha os túbulos seminíferos suficientemente
danificados para comprometer a espermatogênese, porém não o bastante
para elevar a concentração sérica de FSH. Uma biópsia testicular
mostrando túbulos seminíferos normais sugere obstrução ao fluxo.
Concentração de testosterona.
A secreção de testosterona é mais bem avaliada por meio da
quantificação da sua concentração sérica total, uma vez que os níveis
totais do hormônio usualmente refletem com acurácia os níveis de
testosterona livre e as técnicas de ensaio para detecção de testosterona
livre não são tão acuradas quanto aquelas empregadas na detecção de
testosterona total. Esse hormônio é secretado esporadicamente na
circulação, seguindo um padrão de variação diurna, em resposta à
secreção esporádica de LH. A concentração sérica de testosterona é
máxima em torno das 8 horas da manhã e mínima por volta das 20 horas,2
por isso deve ser medida às 8 horas da manhã. Se os resultados forem
baixos ou limítrofes, o teste deve ser repetido duas vezes. A
quantificação da testosterona livre e da SHBG pode ser útil quando os
níveis de testosterona total não refletem com acurácia os níveis de
testosterona livre. Isso ocorre mais frequentemente na obesidade. Para
confirmar o diagnóstico de hipogonadismo em pacientes obesos, a
testosterona livre deve ser quantificada por diálise de equilíbrio ou
calculada a partir da medida das concentrações de testosterona total e
SHBG.
Gonadotrofinas.
Se a concentração de testosterona estiver baixa, é necessário
determinar as concentrações séricas de LH e FSH. Se esses valores
estiverem elevados, significa que o paciente apresenta hipogonadismo
primário. Caso contrário, trata-se de um caso de hipogonadismo
secundário. Em um paciente cuja contagem de espermatozoides seja
distintamente anormal, porém a concentração sérica de testosterona seja
normal, a combinação de uma elevada concentração de FSH e de uma
concentração normal de LH indica que os túbulos seminíferos foram
danificados e as células de Leydig, todavia, continuam funcionando
normalmente.
Para
pacientes com hipogonadismo secundário, indica-se imagem por
ressonância nuclear magnética (RNM) da região selar. A RNM mostrará se o
paciente apresenta massa no local e, caso possua, se está localizada na
hipófise, hipotálamo ou região parasselar.
Doenças causadoras de hipogonadismo
Uma
vez que o hipogonadismo do paciente tenha sido identificado como
primário [Tabela 1], ou secundário (Tabela 2), é possível investigar a
etiologia específica do hipogonadismo.
Hipogonadismo primário
Essa
condição pode ser congênita ou adquirida. Numerosos casos de
hipogonadismo primário não possuem causa identificável, por isso é
provável que exista muitas causas ainda desconhecidas.
Congênito. Dentre as anormalidades congênitas causadoras de hipogonadismo primário, a mais comum é a síndrome de Klinefelter.22
Essa síndrome afeta 1,09 a 1,72 a cada 1.000 indivíduos do sexo
masculino. É a apresentação fenotípica dos homens que possuem mais de um
cromossomo X. O genótipo mais frequentemente associado é o 47XXY,
contudo também foram descritos genótipos contendo cromossomos X
adicionais (p. ex., 48XXXY) e mosaicos (p. ex., 46XY/47XXY). O genótipo
47XXY resulta da não disjunção dos cromossomos sexuais de um dos pais
durante a divisão meiótica. O mosaicismo provavelmente resulta de uma
divisão mitótica não disjuntiva após a concepção. O grau de severidade
das consequências fenotípicas usualmente aumenta de acordo com o número
de cromossomos X extras. A severidade também parece variar diretamente
de acordo com o comprimento da repetição CAG N-terminal.23 As
consequências gonadais geralmente se manifestam em dano grave aos
túbulos seminíferos e dano variável (mínimo a severo) às células de
Leydig. Dessa forma, homens com síndrome de Klinefelter comumente
possuem testículos pequenos, ejaculado sem espermatozoides,
infertilidade e concentrações séricas de FSH acentuadamente elevadas,
embora os mosaicos possam apresentar certo grau de espermatogênese.
Mesmo quando há ausência de espermatozoides no ejaculado é possível
aspirá-los a partir dos testículos e utilizá-los para fertilização in
vitro ou injeção intracitoplasmática de espermatozoide.24 As
concentrações séricas de testosterona desses homens variam de normais a
subnormais e o grau de virilização também varia de normal a baixo,
enquanto as concentrações séricas de LH variam de normais a elevadas.
Em
geral, a síndrome de Klinefelter também é marcada por anomalias de
comportamento e nas pernas. Tais anormalidades não possuem relação
direta com os distúrbios gonadais. A anormalidade comportamental
manifesta-se como uma dificuldade para estabelecer interações sociais,
que é identificada na infância e acarreta problemas escolares e,
eventualmente, profissionais. A anomalia do osso longo consiste no
comprimento aumentado das pernas, mas não dos braços. Ela ocorre
independentemente do aumento do comprimento de ambos os braços e pernas,
em decorrência da deficiência de testosterona.
Normalmente,
o diagnóstico da síndrome de Klinefelter pode ser estabelecido por meio
da determinação do cariótipo de leucócitos periféricos. A deficiência
de testosterona, quando presente, pode ser tratada com a reposição do
hormônio (veja adiante), mas a anormalidade comportamental não é
tratável de modo satisfatório. Contudo, participar de um grupo de apoio
pode ser útil para a família do paciente e é necessário comunicar o
diagnóstico aos conselheiros escolares.
O
criptorquidismo (testículos não descidos) também está associado ao dano
testicular e a danos mais significativos aos túbulos seminíferos do que
às células de Leydig. É possível que haja envolvimento de mais de um
mecanismo: a deficiência de testosterona in utero pode inibir a descida,
enquanto o aquecimento do abdome pode provocar mais danos aos
testículos não descidos. A existência de uma anomalia, independentemente
da presença duradoura de um ou mais testículos em localização
abdominal, é sugerida pela elevação dos níveis séricos de FSH ainda no
terceiro mês de vida, bem como por uma contagem anormal de
espermatozoides e por níveis elevados de FSH em adultos mesmo em casos
de criptorquidismo unilateral.25 As consequências clínicas
dependem parcialmente da possibilidade de um ou ambos os testículos
serem não descidos. Se apenas um deles for não descido, há probabilidade
de 25 a 33% de que a contagem de espermatozoides venha a ser subnormal e
os níveis séricos de FSH estejam levemente aumentados. Se ambos os
testículos forem não descidos, a contagem de espermatozoides será
gravemente subnormal e o paciente, infértil. A concentração sérica de
testosterona poderá ser subnormal e o paciente também poderá apresentar
subvirilização. Há maior probabilidade de haver desenvolvimento de
neoplasias nos testículos criptorquídicos. Quando uma orquiopexia é
realizada após a puberdade, essa probabilidade também é maior do que
quando o procedimento é realizado antes dessa fase.26,27 O
diagnóstico é estabelecido com base na falha em apalpar um testículo que
esteja junto ao escroto ou que possa ser manualmente manipulado a
partir do canal inguinal, dentro do escroto. Mesmo que não seja possível
apalpar um testículo, este usualmente pode ser identificado por
ultrassonografia ou RNM.
Por
décadas, a varicocele – uma varicosidade do plexo venoso junto ao
escroto – foi considerada uma possível causa de infertilidade. Segundo o
mecanismo proposto, a varicocele provoca um aumento do fluxo sanguíneo
que compromete a espermatogênese por elevar a temperatura escrotal a
níveis acima do normal. Entretanto, as temperaturas escrotais são
semelhantes em homens inférteis com e sem varicocele, e as varicoceles
não são tão mais comuns em homens inférteis do que em homens férteis.
Portanto, não é possível afirmar com certeza que a varicocele de fato
possa causar infertilidade. Mesmo assim, o tratamento cirúrgico pode ser
corretivo para a infertilidade. Uma metanálise de 36 estudos realizados
em um período de 28 anos revelou que as novas técnicas microcirúrgicas
de varicocelectomia resultaram em taxas mais altas de gravidez
espontânea e em menos recidivas pós-operatórias, quando comparadas a
outras técnicas, como as técnicas de varicocelectomia laparoscópica,
embolização radiológica e varicocelectomia inguinal macroscópica ou
subinguinal.28
A
deficiência congênita de produção de testosterona também pode ser
causada por mutações nos genes codificadores das enzimas necessárias à
biossíntese do androgênio. Esses distúrbios são raros. O sistema de
clivagem da cadeia lateral de colesterol – 3-beta-hidroxiesteroide
desidrogenase/isomerase – e as enzimas 17-alfa-hidroxilase/17,20 liase
são encontrados nas adrenais e nos testículos. Desse modo, deficiências
que afetem qualquer uma dessas enzimas também levam à deficiência
secretória de cortisol. A deficiência de 17beta-hidroxiesteroide
desidrogenase de tipo 3 afeta apenas os testículos. Cada uma dessas
deficiências resulta em uma deficiência secretória de testosterona, que
tem início no primeiro trimestre do desenvolvimento intrauterino, e numa
subsequente virilização incompleta. O grau de incompletude,
especialmente do desenvolvimento fálico, influencia a possibilidade de
bebês com tais deficiências nascerem meninos ou meninas. A deficiência
de testosterona em si pode ser tratada do mesmo modo que a deficiência
de testosterona oriunda de qualquer outra causa.
Deleções no braço longo do cromossomo Y estão associadas à azoospermia ou oligospermia e infertilidade.29 O grau de dano testicular está correlacionado ao tamanho da deleção.
Adquirido.
Numerosas doenças adquiridas podem causar hipogonadismo primário. Entre
elas, estão infecções como a orquite, que constitui uma complicação
incomum da caxumba, podendo ser bi ou unilateral. Nos casos bilaterais,
ambos os testículos inicialmente se tornam acentuadamente inchados e
bastante doloridos, e em seguida entram num processo gradual de atrofia.
É comum o paciente apresentar diminuição da produção de
espermatozoides, porém a diminuição da secreção de testosterona é menos
comum. O diagnóstico é estabelecido por meio da obtenção do histórico de
inchaço testicular doloroso durante um episódio de caxumba sistêmica.
O
tratamento de neoplasias à base de quimioterápicos (especialmente, os
agentes alquilantes) ou radioterapia para linfonodos inguinais com
frequência danifica os túbulos seminíferos. O dano às células de Leydig,
com esse tipo de tratamento, é menos comum. A radioterapia causa danos
proporcionais à dose aplicada, apesar da proteção dos testículos contra o
feixe de radiação. Nos casos de tratamento menos extensivo, o dano pode
ser reversível, mas ainda não há remédios específicos para este fim.
Medicamentos
e drogas de abuso podem causar hipogonadismo. O agente antifúngico
cetoconazol compromete a produção de testosterona. O consumo excessivo
de álcool danifica os testículos.
A infecção pelo HIV e a degradação causada pela AIDS comumente estão associadas ao hipogonadismo.30
Vários mecanismos parecem estar envolvidos nesses casos. Alguns homens
infectados pelo HIV, cujas concentrações de testosterona são subnormais,
apresentam níveis séricos de LH inadequadamente baixos. Isso pode ser o
resultado de certas condições, como desnutrição, consumo abusivo de
opioides e administração de acetato de megestrol, fatores sabidamente
causadores de hipogonadismo secundário. Em outros casos de homens
infectados pelo HIV, a concentração sérica de LH aumenta, apontando o
hipogonadismo primário. Desde a introdução da terapia antirretroviral de
alta potência (HAART – do inglês Highly Active Antiretroviral Therapy), o hipogonadismo passou a ser menos comumente observado em homens infectados pelo HIV.
A
torção testicular pode acarretar um dano permanente se não for
prontamente tratada. Às vezes, o traumatismo pode ser grave o bastante
para produzir comprometimento funcional.
O
hipogonadismo pode ser induzido (cirúrgica ou quimicamente) como forma
de estratégia terapêutica, em casos de câncer de próstata avançado. A
orquiectomia bilateral é empregada no tratamento de casos de câncer
testicular bilateral. Todavia, quando se trata de pacientes com câncer
testicular – diferentemente daqueles com câncer de próstata tratados à
base de castração – não há motivos para conter a reposição de
testosterona.
Hipogonadismo secundário
Assim
como o hipogonadismo primário, o hipogonadismo secundário (também
chamado hipogonadismo hipogonadotrófico) possui causas congênitas e
adquiridas em homens [Tabela 2]. Diferente do hipogonadismo primário, o
secundário muitas vezes está associado a uma causa que pode ser
amenizada com tratamento específico. Por isso, é particularmente
importante descobrir a causa desse sintoma.
Alguns
casos de hipogonadismo secundário não estão associados a nenhuma
anomalia hormonal e são denominados “isolados”. Em outros casos, a
condição parece ser causada por uma deficiência de secreção de GnRH pelo
hipotálamo, podendo ser congênito ou adquirido. Quando a causa é
congênita, a condição pode ou não ser parte da síndrome de Kallmann.31
Pacientes com essa síndrome apresentam secreção deficiente de GnRH,
variavelmente associada à anosmia, criptorquidismo, cegueira para as
cores vermelho e verde, além de anomalias nos ossos longos e no trato
urogenital. A síndrome de Kallmann pode ocorrer isoladamente ou em
famílias. Os casos familiares podem ser herdados segundo um padrão
autossômico dominante, com expressão limitada principalmente aos homens,
ou seguindo um padrão de herança ligada ao X recessivo. Em alguns
pacientes com síndrome de Kallmann ligada ao X recessivo, os defeitos
genéticos responsáveis tanto pela secreção deficiente de GnRH como pela
anosmia consistem em mutações nos genes codificadores de moléculas de
adesão de superfície celular (p. ex., KAL-1;32 KAL-2, também chamada de receptor para o fator de crescimento de fibroblasto-1;33
e procineticina) ou dos receptores dessas moléculas (p. ex., receptores
de procineticina). No início da embriogênese, os neurônios secretores
de GnRH normalmente migram dos placoides olfativos para o bulbo olfativo
e, em seguida, para o hipotálamo. Para que essa migração seja
bem-sucedida, as moléculas de adesão de superfície celular devem estar
funcionando adequadamente. As mutações que afetam essas moléculas,
portanto, são responsáveis tanto pela anosmia como pelo hipogonadismo
hipogonadotrófico.
Outras
causas de hipogonadismo secundário isolado são as mutações em um ou
vários genes reguladores diretos ou indiretos da secreção de
gonadotrofina, entre os quais o gene codificador do receptor do GnRH; o
gene DAX-1, que acarreta hipogonadismo hipogonadotrófico e hipoplasia
adrenal;34 genes codificadores de leptina35 ou de
receptor de leptina, quando o hipogonadismo hipogonadotrófico está
associado à obesidade mórbida; e genes codificadores das subunidades
LHbeta36 ou FSHbeta37.
Outras
causas de hipogonadismo hipogonadotrófico estão associadas a outros
déficits hormonais hipotalâmicos ou hipofisários. Algumas são
consequências de uma expressão defeituosa de fatores de transcrição
necessários à diferenciação celular da hipófise anterior, incluindo
LHX4, HSX1,39 e PROP-1.40
As
doenças adquiridas que resultam em hipogonadismo hipogonadotrófico são
os adenomas hipofisários, outros tumores benignos e cistos da área
selar, bem como malignidades que surgem ou formam metástases nessa
região. Essas lesões usualmente podem ser detectadas via IRM. As doenças
infiltrativas (p. ex., sarcoidose, hemocromatose) geralmente produzem
manifestações sugestivas do diagnóstico em outros sistemas orgânicos.
Tumores, cistos, lesões infiltrativas, sangramento agudo para dentro da
hipófise (apoplexia) e infarto hipofisário (síndrome de Sheehan) com
frequência são acompanhados de deficiências de outros hormônios
hipotalâmicos ou hipofisários, e usualmente resultam em perda permanente
da secreção de gonadotrofinas.
O
hipogonadismo hipogonadotrófico também pode resultar da inibição da
secreção da gonadotrofina por alguma doença sistêmica,
hiperprolactinemia, medicamentos, doses elevadas de glicocorticoides e
opioides. Desde a introdução e disseminação do uso dos opioides de
liberação controlada para o tratamento da dor crônica, o desenvolvimento
de hipogonadismo em decorrência do uso desses medicamentos passou a ser
mais comum.41 Dependentes de heroína podem desenvolver
hipogonadismo pelo mesmo mecanismo. Homens com diabetes de tipo 2 são
mais propensos a apresentar baixas concentrações séricas de
testosterona, se comparados àqueles cujos níveis de glicose são normais.
Nesses pacientes, é provável que o hipogonadismo seja secundário, uma
vez que os níveis de LH não estão aumentados, todavia o mecanismo
permanece desconhecido.
A
puberdade tardia é diagnosticada em qualquer menino cujo
desenvolvimento puberal não se inicia em uma idade equivalente a mais de
dois desvios padrão da média da idade normal. Em alguns casos, esse
atraso representa uma variação normal. Tais pacientes eventualmente
entram espontaneamente na puberdade. Em outros casos, o atraso é causado
pelo hipogonadismo secundário. Pode ser difícil distinguir uma variante
normal de um atraso patológico. Em geral, nem o grau de hipogonadismo
nem qualquer teste bioquímico ajudam a estabelecer essa distinção. Uma
história familiar de puberdade tardia ou baixa estatura constitucional
aumentam a probabilidade de puberdade tardia fisiológica. A anosmia,
sintomas de lesão quiasmática ou outros sinais de doença hipotalâmica ou
hipofisária específica aumentam a probabilidade de uma lesão como
causa. Em diversos casos, o diagnóstico pode ser estabelecido apenas por
meio de uma contínua observação.
Uma
concentração sérica de testosterona inequivocamente subnormal aliada a
uma concentração de LH não aumentada em um homem saudável (a não ser por
isso) podem ser consideradas uma forma de hipogonadismo secundário.42
Tratamento
Reposição de testosterona
A
testosterona pode ser reposta tanto no hipogonadismo primário como no
secundário. Diferente do estrogênio, a testosterona em si não é passível
de reposição oral, porque é rapidamente catabolizada em sua primeira
passagem pelo fígado. Os derivados da testosterona que são alquilados na
posição 17-beta não passam por essa rápida etapa catabólica hepática.
Entretanto, esses agentes parecem não produzir totalmente os efeitos
virilizantes da testosterona e podem causar toxicidade hepática,
incluindo icterícia colestática, uma condição cística hepática
denominada peliose e, possivelmente, carcinoma hepatocelular. Em
consequência, os androgênios 17-alfa-alquilados não devem ser utilizados
para tratar a deficiência de testosterona.
Atualmente,
a terapia de reposição é administrada pelas vias intramuscular ou
transdérmica. As formulações intramusculares (enantanato de testosterona
e cipionato de testosterona) são ésteres de testosterona de ação
prolongada produzidos pela esterificação do grupo hidroxila na posição
17beta com um ácido graxo. As formulações intramusculares de fato
produzem virilização total e usualmente são administradas em doses de
150 a 200 mg, por meio de uma injeção intramuscular profunda que é
aplicada a cada 2 semanas. Com esse regime, os valores de testosterona
atingem o pico em 1 a 2 dias após a injeção e caem ao nível mais baixo
pouco antes da próxima injeção [Figura 2].43 Essas flutuações são percebidas – somente por alguns pacientes – como flutuações energéticas, de humor e de libido.
Figura
2. As concentrações séricas de testosterona diferem no curso da
administração prolongada de três preparações distintas de testosterona
para homens hipogonadais: injeção (a), emplastro transdérmico (b) e gel
(c).
A testosterona transdérmica já é disponibilizada tanto sob a forma de emplastros como sob a forma gel44
[Figura 2]. Na maioria dos homens hipogonadais, essas preparações
resultam em concentrações séricas de testosterona situadas em nível
normal, que flutuam fisiologicamente, promovendo uma estabilização
razoável da energia, humor e libido. Esse padrão favorável de
concentrações séricas de testosterona, aliado à infrequência dos efeitos
colaterais, faz das preparações transdérmicas o melhor método de
reposição da testosterona para a maioria dos homens hipogonadais.
Durante
a terapia de reposição, os médicos clínicos devem monitorar os
pacientes quanto à eficácia e os efeitos colaterais causados pela
testosterona. A eficácia é determinada pela quantificação da
concentração sérica do hormônio, que deve estar medianamente situada na
faixa da normalidade, a meia distância entre as injeções de ésteres de
testosterona agendadas e qualquer momento posterior à aplicação de uma
preparação transdérmica. As concentrações séricas de testosterona,
contudo, podem ser variáveis quando essas preparações são utilizadas, de
modo que é necessário quantificar a testosterona mais de uma vez para
determinar se a dose inicial é adequada. A testosterona sérica deve ser
medida novamente depois que a dose for alterada e, subsequentemente,
mais uma ou duas vezes por ano. Se a concentração sérica de testosterona
permanecer dentro da faixa normal, o paciente irá apresentar reversão
das consequências da deficiência desse hormônio. Especificamente, deve
haver aumento dos níveis de energia, libido, concentração de
hemoglobina, massa muscular e densidade óssea.45
Homens
acima dos 40 anos devem ser avaliados quanto à existência de doenças
testosterona-dependentes, como câncer de próstata, hiperplasia
prostática benigna e eritrocitose, antes do início do tratamento.
Durante o tratamento, o desenvolvimento dessas condições deve ser
monitorado.46 Entretanto, até o momento não existem
evidências de que qualquer uma dessas condições seja mais provavelmente
exacerbada pela dose fisiológica de testosterona exógena do que de
testosterona endógena.
Estimulação da espermatogênese
Quando
a produção de espermatozoides é comprometida por um dano aos túbulos
seminíferos, nenhum tratamento é capaz de melhorar a fertilidade. No
entanto, se ao menos um pequeno número de espermatozoides maduros for
produzido, é possível utilizá-los para fertilização in vitro. Quando a
contagem de espermatozoides se torna baixa em decorrência de uma doença
hipofisária ou hipotalâmica, a administração de gonadotrofinas exógenas
com frequência pode estimular a produção de espermatozoides a atingir
níveis normais. Quando o hipogonadismo ocorre após a puberdade
(pós-puberal), geralmente só o LH precisa ser reposto. A hCG exerce o
mesmo efeito estimulatório exercido pelo LH sobre as células de Leydig,
contudo apresenta meia-vida mais longa e por isso é preferível ao LH
para a estimulação da espermatogênese. Quando o hipogonadismo ocorre
antes da puberdade (pré-puberal), o paciente usualmente requer terapia
de reposição para deficiência tanto de LH como de FSH.47 No
hipogonadismo secundário à doença hipotalâmica, a espermatogênese também
pode ser estimulada pela administração pulsátil de GnRH. Mesmo que não
haja espermatozoides no ejaculado, às vezes é possível aspirar
espermatozoides a partir do epidídimo e usá-los para fertilização in
vitro ou injeção intracitoplasmática de espermatozoide.
Insensibilidade ao androgênio
A
insensibilidade tecidual generalizada à ação dos androgênios resulta em
anormalidades similares àquelas produzidas pela deficiência de
testosterona. Esse tipo de insensibilidade pode ser causada por
anormalidades envolvendo o receptor de androgênio48 ou a enzima 5-alfa-redutase de tipo 2.49 Ambas as condições resultam de mutações genéticas, são raras e acarretam virilização incompleta dos genitais externos.
Foram
descritas diversas mutações no gene codificador do receptor de
androgênio. Algumas dessas mutações interferem na ligação do androgênio
ao receptor, enquanto outras afetam a ligação do complexo
androgênio-receptor ao DNA da células androgênio-responsivas.
As
manifestações clínicas das diversas anormalidades de receptor também
são variáveis. Na apresentação clínica mais severa, denominada
insensibilidade total a androgênios, o indivíduo afetado nasce com os
testículos nos canais inguinais, não possui genitais internos e os
genitais externos são femininos. Na puberdade, a concentração sérica de
testosterona aumenta, atingindo níveis normais altos ou discretamente
acima do normal, contudo sem desenvolvimento de pelos púbicos. As mamas
se desenvolvem porque a testosterona ainda pode ser convertida a
estradiol. Na insensibilidade incompleta a androgênios, ocorre uma fusão
parcial variável das pregas labiais: um menor grau de fusão resulta na
formação de genitais que ainda são mais femininos do que masculinos,
enquanto um grau maior de fusão leva à formação de genitais mais
masculinos, ainda que de modo incompleto. A forma menos severa de
resistência a androgênios manifesta-se apenas como infertilidade e, às
vezes, ginecomastia. Em todas essas formas de resistência a androgênios,
as concentrações séricas de testosterona e LH estão dentro da faixa que
vai de normal alto a discretamente elevado.
A
doença de Kennedy consiste em uma forma relativamente branda de
insensibilidade a androgênios e, todavia, em uma forma progressivamente
severa de neuropatia bulbar espinal. É causada por uma mutação que
resulta na duplicação do número de glutaminas N-terminais no receptor de
androgênio.
Outras
mutações afetando o receptor de androgênio foram descritas em casos de
câncer de próstata metastático que se tornaram resistentes à deprivação
de androgênios. Tais mutações podem fazer com que outros ligantes,
diferentes da testosterona, se liguem ao receptor e estimulem as funções
receptor-dependentes mesmo na ausência da testosterona.
Mutações
no gene codificador da 5-alfa-redutase de tipo 2 também levam à
virilização incompleta dos genitais externos, pois a virilização requer a
conversão da testosterona em DHT por ação dessa enzima.50 Ao
nascimento, a maioria dos bebês do sexo masculino com deficiência da
enzima 5-alfa-redutase de tipo 2 possui genitais externos
predominantemente femininos, de modo que o sexo de criação usualmente é
feminino. Na puberdade, a concentração sérica de testosterona aumenta e,
até certo ponto, sobrepuja a falta de DHT. A ligação da testosterona
diretamente ao receptor de androgênios provoca aumento do tamanho do
pênis e crescimento de pelos, seguindo um padrão de homem adulto. Se o
paciente está sendo criado como menina, é possível remover os testículos
antes da chegada da puberdade, a fim de evitar esses eventos.
Ginecomastia
A
ginecomastia consiste no desenvolvimento de tecido glandular mamário em
um homem. Na maioria dos casos, a estimulação do tecido glandular
parece resultar de um aumento da proporção de estrogênio em relação ao
androgênio.
Epidemiologia
A
ginecomastia ocorre comumente em todas as idades, no entanto é ainda
mais frequente durante a infância, puberdade e a partir da meia-idade em
diante. Em maiores proporções, a ginecomastia pode ser detectada em 10 a
20% dos meninos em fase puberal intermediária e em mais de 50% dos
homens com idade acima de 50 anos. Essas taxas elevadas provavelmente
refletem as alterações hormonais típicas das referidas faixas etárias e
não representam doença.
Etiologia e patogênese
O
mecanismo comum, no caso da ginecomastia, parece ser um efeito
estrogênio-para-androgênio aumentado sobre as mamas. Esse sistema pode
envolver um aumento do efeito do estrogênio, diminuição do efeito do
androgênio ou ambos, podendo ainda resultar de alterações na produção
hormonal ou na ação hormonal ao nível celular. Normalmente, a maior
parte do estrogênio contido na circulação periférica dos homens é
produzida pela conversão da testosterona em estradiol ou da
androstenediona em estrona por ação do complexo enzimático da aromatase,
que se concentra no tecido adiposo e no fígado.
Exposição ao estrogênio exógeno
A
ginecomastia induzida por estrogênios exógenos é pouco comum. Os casos
relatados envolvem a exposição ao creme vaginal utilizado pela parceira,
aplicação de cremes anticalvície, ingestão dietética e exposição
ocupacional.
Secreção de estrogênio aumentada
A
causa mais comum de aumento da secreção de estrogênios endógenos é o
aumento da estimulação dos testículos pela gonadotrofina, com
consequente aumento dos níveis intratesticulares de aromatase e, assim,
aumento da quantidade de estradiol secretado em relação à de
testosterona. Esse é o provável mecanismo pelo qual a ginecomastia
ocorre em indivíduos do sexo masculino durante a puberdade, com a
realimentação após um período de inanição, e após o tratamento
bem-sucedido de uma doença severa (p. ex., doença cardíaca, hepática ou
renal crônicas). Em tais circunstâncias, um período de hipogonadismo
secundário é seguido pela secreção normal de gonadotrofina. A secreção
aumentada de gonadotrofina (especificamente, de LH) também é causa de
ginecomastia no hipogonadismo primário. A secreção aumentada de hCG é
causa dessa condição em pacientes que possuem tumor testicular ou
hepático. A administração terapêutica (p. ex., para estimular a
espermatogênese) de hCG atua de modo semelhante, sobretudo quando a dose
aplicada é excessiva.
Conversão periférica aumentada de androgênios em estrogênios
A
conversão periférica aumentada da testosterona em estradiol ou da
androstenediona em estrona pode ocorrer por meio de diversos mecanismos:
(1) uma taxa aumentada de conversão, como no hipertireoidismo ou na
cirrose hepática; (2) um aumento da quantidade de aromatase, como na
obesidade; e (3) uma quantidade aumentada de substrato para
aromatização, como se observa quando um carcinoma adrenal secreta
grandes quantidades de androstenediona ou quando um androgênio
aromatizável (p. ex., éster de testosterona de ação prolongada) é
administrado em doses excessivas.
Inibição da ligação do androgênio
Numerosos
fármacos causadores de ginecomastia parecem exercer esse efeito
ligando-se ao receptor de androgênio e, assim, bloqueando a testosterona
endógena. Em consequência, os androgênios endógenos apresentam menor
ação androgênica, porém ainda são convertidos em estrogênios. Entre os
fármacos que bloqueiam o receptor de androgênio estão a espironolactona,
a cimetidina, a flutamida, a bicalutamida e o acetato ciproterona. Os
distúrbios hereditários envolvendo o receptor de androgênio produzem
resultados semelhantes, embora nesses casos a inibição da ligação seja,
obviamente, irreversível.
Diagnóstico
O
diagnóstico de ginecomastia é confirmado pelo exame físico. O
examinador posiciona o polegar e o dedo indicador estirados sobre e
abaixo do mamilo do paciente e os aproxima, como o movimento de um
compasso, movendo-os na direção do mamilo, apertando a parede torácica. À
medida que os dedos se aproximam, percebe-se os tecidos subcutâneos
moles e a ginecomastia, firme. O diâmetro da ginecomastia pode ser
medido com o auxílio de uma régua. Geralmente, a mamografia é
desnecessária. A ginecomastia costuma ser bilateral, frequentemente
assimétrica e apenas às vezes unilateral. Se o tecido apresentar
sensibilidade, é mais provável que a ginecomastia tenha aparecido
recentemente.
Depois
da confirmação, o clínico precisa descobrir a causa. Para tanto, é
necessário investigar quais medicamentos o paciente utiliza e a possível
existência de doenças que sabidamente causam ginecomastia [ver
Etiologia e Patogênese].51
Diagnóstico diferencial
A
ginecomastia deve ser distinguida do carcinoma de mama masculino, que é
uma condição rara, bem como da adiposidade, que é comum. A suspeita de
câncer de mama deve ser considerada quando o aumento da mama for
unilateral, na ausência de sensibilidade, apresentar localização não
centralizada diretamente abaixo do mamilo e for duro. O diagnóstico pode
ser confirmado por mamografia. A adiposidade mamária é bilateral e
usualmente pode ser distinguida da ginecomastia pela ausência de tecido
glandular palpável ao exame físico.
Tratamento
Na
puberdade, a ginecomastia costuma regredir espontaneamente, embora isso
ocorra ao longo de vários anos. Portanto, o tratamento é indicado
somente se a ginecomastia for motivo de angústia psicológica. O
tratamento mais correto é a remoção cirúrgica, que é mais bem feita por
cirurgiões plásticos. Estudos com amostras menores sugerem que os
fármacos antiestrogênio tamoxifeno e raloxifeno, bem como o inibidor de
aromatase testolactona, podem reduzir (mas não eliminam) a ginecomastia.
Em um estudo randomizado, todavia, constatou-se que o anatrozol (um
potente inibidor de aromatase) produziu efeitos semelhantes aos de um
placebo.52 Nenhum desses fármacos teve o uso aprovado pelo
Food and Drug Administration para essa finalidade. Em adultos com
hipogonadismo primário, a ginecomastia regride mediante a reposição de
testosterona. O uso de tamoxifeno usualmente é eficaz na prevenção da
ginecomastia decorrente do tratamento de câncer de próstata com
antiandrogênio.48
Disfunção erétil
A
disfunção erétil consiste na incapacidade de alcançar ou manter uma
ereção que seja suficiente para o intercurso. Embora a disfunção erétil
ocasional não seja indicativa de doença, sua ocorrência na maioria das
tentativas de atividade sexual pode apontar a existência de uma doença,
além de ser bastante problemática para o casal, em geral. Disfunção
erétil não significa diminuição da libido, pois esta representa uma
diminuição do interesse sexual. Ambas as condições costumam ter causas
distintas e, assim, tratamentos diferentes.
Epidemiologia
Em
um estudo transversal envolvendo homens não institucionalizados com
idade entre 40 e 70 anos, todos os graus de disfunção erétil – desde
mínima a total – foram observados em 50% dos homens. A disfunção erétil
total afetou 5% dos homens com 40 anos de idade e 15% dos homens com 70
anos de idade.53 No seguimento longitudinal de homens
pertencentes à mesma população, constatou-se uma incidência de novos
casos equivalente a 2,5% ao ano.54
Patofisiologia
O
desenvolvimento de uma ereção requer mecanismos psicológicos,
neurológicos e vasculares intactos. Os estímulos eróticos resultam em
impulsos neurais que são transportados do córtex cerebral para o pênis
via medula espinal, enquanto a estimulação peniana resulta na produção
de impulsos neurais que formam uma alça na direção da medula e voltam
para o pênis por meio dos nervos parassimpáticos. Esses estímulos fazem o
sangue fluir para dentro do corpo cavernoso. O fluxo de entrada de
sangue é mediado pelo relaxamento da musculatura lisa arteriolar e
subsequente dilatação arteriolar sob influência do óxido nítrico, cuja
produção é catalisada pela enzima óxido nítrico sintetase. O óxido
nítrico, por sua vez, induz a produção de monofosfato de guanosina
cíclica (cGMP, cyclic guanosine monophosphate), que também relaxa a
musculatura lisa arteriolar e intensifica o fluxo sanguíneo. O fluxo de
saída de sangue a partir do corpo cavernoso congestionado é impedido por
um aumento da resistência venosa.
A
interrupção de qualquer uma dessas etapas pode acarretar disfunção
erétil. Os mecanismos neurais podem ser interrompidos mecanicamente,
como ocorre na prostatectomia radical, cirurgia para aneurisma aórtico
abdominal ou traumatismo na medula espinal, bem como patologicamente,
como na neuropatia autonômica diabética ou nas síndromes de
insuficiência autonômica. Essas etapas também podem ser funcionalmente
prejudicadas, por exemplo, pela ação de certos fármacos. O mecanismo
vascular pode ser interrompido pelas doenças que afetam vasos de grande
calibre (ateroscleróticas) ou de pequeno calibre (diabéticas). O
mecanismo pelo qual a hiperprolactinemia causa impotência ainda é
desconhecido, embora pareça não ser via hipogonadismo.
Diagnóstico
Histórico,
exame físico e testes laboratoriais contribuem para a descoberta da
causa de disfunção erétil. A partir do histórico, o médico pode
determinar se o paciente está tomando algum medicamento ou apresenta
doença associada a esse distúrbio. Vários fármacos empregados no
tratamento da hipertensão ocasionalmente podem provocar disfunção
erétil, tais como diuréticos tiazídicos e agentes alfa e
betabloqueadores. Outros fármacos capazes de produzir disfunção erétil
são os tranquilizantes, antidepressivos e álcool consumido em excesso. O
médico deve fazer perguntas para descobrir um possível antecedente de
diabetes prolongada, incluindo outras manifestações de neuropatia
diabética, e explorar fatores psicogênicos, tais como depressão,
ansiedade, fadiga, estresse interpessoal e doença crônica. O médico deve
perguntar se o paciente consegue obter uma ereção sob quaisquer
circunstâncias. Se o paciente tem ereção ao acordar de manhã ou é capaz
de ter ereção em certas ocasiões mas não em outras, é mais provável que a
causa do distúrbio seja psicogênica, em vez de orgânica.
Ao
exame físico, a ausência de pulsos periféricos e a presença de ruídos
femorais apontam a existência de doença vascular. A doença neurológica é
indicada pela diminuição da sensibilidade ao toque e da propriocepção,
bem como pela diminuição do reflexo cremastérico (retração dos
testículos mediante golpe/afago na região ipsilateral interna da coxa).
A
avaliação laboratorial deve incluir a quantificação da concentração
sérica de prolactina, o único meio de detectar a hiperprolactinemia. A
concentração sérica de testosterona deve ser quantificada num homem que
apresente diminuição da libido e disfunção erétil, porém raramente será
útil se for obtida a partir de um homem com disfunção erétil e libido
normal.
Diagnóstico diferencial
Sempre
que possível, disfunção erétil deve ser diferenciada da libido
diminuída, pois ambas as condições frequentemente estão associadas a
causas e tratamentos diferentes, mas podem ocorrer ao mesmo tempo. A
diminuição da libido consiste na diminuição do interesse sexual, cuja
principal causa hormonal é o hipogonadismo. Este, por si só, não
compromete a capacidade erétil. Um homem cuja libido esteja normal e,
contudo, tenha dificuldade para obter uma ereção provavelmente não
possui hipogonadismo. Por outro lado, um homem cuja libido e potência
estejam diminuídas deve ser avaliado quanto à possibilidade de
hipogonadismo e disfunção erétil.
Tratamento
O
tratamento da disfunção erétil depende da causa. Se a fonte do problema
for uma medicação, é possível substituir o fármaco por outro que não
afete a função erétil. Exemplificando, se o paciente estiver sob
tratamento para hipertensão com betabloqueador ou diurético tiazida, é
possível substituir tais agentes por um inibidor da enzima conversora de
angiotensina (ACE, angiotensin converting enzyme) ou por um bloqueador
de canais de cálcio – ambos agentes que aparentemente não interferem na
função erétil.
Distúrbios
subjacentes devem ser corrigidos sempre que possível. A
hiperprolactinemia pode ser tratada com um agonista de dopamina (p. ex.,
cabergolina).
O
tratamento mais efetivo para a disfunção erétil de origem psicogênica,
vascular ou neurológica é a administração de um inibidor de
fosfodiesterase, como o sildenafil, vardenafil ou tadalafil. Um guia de
prática clínica criado pelo American College of Physicians defende que a
escolha do inibidor a ser adotado seja feita com base na preferência
individual, considerando a facilidade do uso, custos e perfil de efeitos
colaterais.55 Esses agentes inibem a fosfodiesterase – a
enzima que degrada cGMP – e, portanto, intensificam o relaxamento da
musculatura lisa no corpo cavernoso, aumentando o fluxo sanguíneo
arteriolar e promovendo a ereção. Em 4 estudos controlados randomizados
de de comparação direta, comparando os fármacos sildenafil, vardemafil e
tadalafil, a melhora da disfunção erétil e os efeitos colaterais
observados foram semelhantes entre os diferentes tratamentos.56
Outros
tratamentos incluem instilação intrauretral de alprostadil, injeção
intracavernosa de alprostadil ou prostaglandina E1 e aplicação de uma
bomba a vácuo junto ao pênis. Essas alternativas são mais incômodas e
por isso menos populares que o uso dos inibidores de fosfodiesterase,
mesmo quando são efetivas.
O autor não possui relações comerciais com os fabricantes de produtos ou prestadores de serviços mencionados neste capítulo.
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